quinta-feira, 10 de março de 2011

A capacidade de ver por detrás do óbvio...



A Quaresma é o contrário daquilo que, às vezes, se faz passar. Uma estação tristonha e austera, onde predominam as privações e os jejuns soturnos, que ninguém nos explica de modo satisfatório. Uma quadra lilás, cheia de imperativos que nos roem por dentro, mais como um remorso do que uma sementeira de alegria.

A Quaresma é o contrário disso. Quaresma sugere palavras vivas: conversão, reconciliação, renascimento…Quaresma é a primavera que Deus oferece à Igreja, para que todos acordemos da paralisia dos nossos invernos interiores e desatemos a florir.

Quaresma é redescobrir a juventude com uma energia que trazemos na alma, a possibilidade real de recomeçar, de ser melhor outra vez e ainda outra vez. Não é um ritual de ano a ano, é um abanão ao nosso modo de viver, para que nos desinstalemos e compreendamos que Deus não nos quer amarrados a uma ‘vidinha’ que não reflecte nada de grande ou apreciável: nem Amor, nem, justiça, nem esperança.

A Quaresma é, assim, uma aposta divina nas nossas histórias humanas, ás vezes demasiado humanas. E por ser tão importante não é uma receita, é uma proposta de caminho(…). Estamos em construção!

Às vezes enchemo-nos de coisas supérfluas que só atravancam. Falsos projectos, muitos preconceitos, críticas fáceis, invejas, orgulho, egoísmo qb. E terminamos como um joguete nas mãos das nossas emoções mais superficiais. (…).

Tudo isto seria um caminho terrivelmente intimista se não nos mandasse ao encontro dos outros. A esmola (uma partilha material e espiritual) tem de ser uma aliança e um compromisso, mais do que um acto pontual. Passa a ser a nossa atitude, seguindo o estilo do nosso Mestre que ‘não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida.

José Tolentino Mendonça

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